Falar de leitura no Brasil é algo realmente delicado, mas sempre necessário. Isso porque, segundo dados da pesquisa realizada pelo Instituto Pró-Livro, Itaú Cultural e IBOPE, e divulgada em outubro de 2020, apenas 52% da população tem hábito da leitura, ou seja, pouco mais de 100 milhões de pessoas que, segundo a metodologia de coleta de informações, leram pelo menos um livro nos últimos três meses. Este número indica que 4,6 milhões de pessoas deixaram de ler em relação aos dados da pesquisa anterior, realizada em 2015.
Só para comparar, em 2019, 88% dos franceses se declararam leitores assíduos – com uma média de mais de 20 livros devidamente lidos nos últimos 12 meses, algo realmente longe da realidade brasileira.
Ok, calma. Pode guardar o seu calmante preferido e vamos parar com esse assunto por aqui, até porque mercado editorial não é o nosso foco. Mas é necessário deixar bem claro que o hábito da leitura é algo fundamental para a formação social e cultural de qualquer pessoa, principalmente para os fotógrafos que “fotografam com a sua cultura” (ok, é uma frase clichê, mas eu não consegui evitar – até porque é uma verdade!).
Basicamente, a fotografia nos oferece três tipos de literatura:
Técnica
Do básico ao avançado, é o livro que nos ensina, ou nos atualiza, dos quesitos técnicos do equipamento fotográfico. Em uma rápida passada na livraria, vemos que é a categoria de livros com maior oferta de títulos, até porque o assunto requer leituras e releituras conforme a tecnologia vai avançando.
Conceitual
É onde os pensadores da fotografia debatem o caráter objetivo e subjetivo das imagens, da comunicação, da arte e de toda as formas de pensamento que rondam o ato fotográfico. É uma leitura mais complicada, densa, geralmente reservada para quem estudou fotografia ou comunicação nos cursos de graduação e pós-graduação. De qualquer forma, é um tipo de texto que deve ser visto como necessário para qualquer fotógrafo, porque tira o nosso trabalho do lugar comum e o coloca em uma perspectiva mais profunda do que apenas um “apertar de um botão” (quem nunca ouviu isso de um cliente ainda não se formou em fotografia na escola da vida).
Fotográfica
São as publicações que também são conhecidas como fotolivros (não confundir com livro de fotografia, categoria na qual se encaixam os dois tipos de publicação acima). São mais do que portfólios, ou apenas livros fotográficos: é a realização de um trabalho criado, planejado e executado com cuidado pelo fotógrafo. Geralmente são os mais caros, contudo são os mais interessantes.
A oferta deste tipo de material é enorme. Porém, temos fatores que limitam em muito o consumo desse material: nem sempre todas as publicações são traduzidas para o português, a média de preço é alta para o nosso padrão de consumo e a tiragem desses livros é bem menor e eles tendem a sumir das livrarias mais rápido que o normal. Mas a leitura e o estudo de todas essas publicações é fundamental porque:
Padrão de qualidade
O repertório cultural de um fotógrafo é a base do seu desenvolvimento. Com o tempo, e conforme evoluímos e ampliamos nossos conhecimentos técnicos e conceituais, as fotos começam a refletir esse crescimento. A linguagem fica mais refinada, a técnica se torna mais precisa e assim podemos partir para novas experimentações cada vez mais criativas.
O cliente vai ficar de boca aberta
Chegou o dia de entregar aquele ensaio para a revista e o editor fica com cara de interrogação. Você logo saca aquela explicação matadora: “Como o tema era ‘moda dos anos 20’, achei por bem usar a estética do cinema expressionista alemão, com esse preto-e-branco bastante contrastado, maquiagem carregada e muita luz e sombra. Andei estudando um pouco sobre a obra e a estética de Fritz Lang e acho que isso influenciou bastante esse trabalho.” Uma justificativa como essa pode parecer enrolação pura, mas apresentam informações válidas e interessantes sobre o assunto, sustentando escolhas criativas que nem sempre são evidentes.
Mais opções de trabalho
Já pensou em dar aulas? Ou criar vídeos para o YouTube? E quem sabe ensinar crianças carentes a ter uma profissão? As opções para quem tem um repertório variado são grandes, ainda mais nesses tempos onde a informação vale muito dinheiro.
Então, por onde começar?
Opções não faltam e as publicações não ficam limitadas às livrarias. Sebos, sites de produtos de segunda mão e redes sociais oferecem oportunidades interessantes por valores bem variados. Também vale lembrar que os e-books são boas opções para quem não tem espaço na estante ou gosta de levar seus livros para todos os cantos. E sites, blogs e revistas especializadas sempre oferecem artigos interessantes e que podem ser arquivados para consultas futuras. Mesmo assim, segue a minha lista de sugestões para a sua biblioteca particular:
– O Novo Manual de Fotografia, John Hedgecoe, Ed. Senac – provavelmente foi o primeiro livro de muita gente, e segue como uma das publicações de referência do segmento fotográfico. Didático e detalhado, este manual é um livro que não envelhece tão fácil.
– A Câmara Clara, Roland Barthes, Ed. Nova Fronteira – um livro que é presença constante nos cursos de comunicação e também uma referência quando o assunto é fotografia. Não é uma leitura fácil – Barthes analisa a fotografia sob o viés da semiologia –, mas seu texto nos leva a refletir sobre assuntos fundamentais da imagem, como sua relação com o homem e com o tempo.
– Fotografia & História, Realidades e Ficções na Trama Fotográfica e Os tempos da Fotografia, Boris Kossoy, Ateliê Editorial – além de ser um dos mais importantes fotógrafos brasileiros, Kossoy também é um destacado teórico do pensamento fotográfico. Nessa trilogia, ele discute o valor da fotografia como documento histórico e valioso veículo da memória.
– A Câmera, O Negativo e A Cópia, Ansel Adams, Ed. Senac – outra trilogia importante e, talvez, a mais conhecida de todas as publicações sobre fotografia. Nesses três livros, Adams apresenta todo o funcionamento do aparato fotográfico, enquanto extrai de toda essa informação técnica as possibilidades criativas da imagem.
– Os Americanos, Robert Frank, IMS – Frank rodou os EUA durante nove meses e retratou a vida dos norte-americanos durante a segunda metade dos anos 1950, um trabalho que rendeu mais de 20 mil fotos. O livro, considerado um dos ícones da fotografia, apresenta as 83 principais imagens dessa viagem imersiva.
– Ligeiramente Fora de Foco, Robert Capa, Cosac Naify – aqui eu saio um pouco da nossa proposta, justamente porque esse livro é realmente “um ponto fora da curva”. Capa sempre foi reconhecido como um dos primeiros fotojornalistas a se tornar uma celebridade, mas aqui, além de mostrar as fotos realizadas durante a Segunda Guerra Mundial, ele também narra de próprio punho a sua trajetória nos campos de guerra da Europa. Não é um relato histórico totalmente fiel – ele toma algumas “liberdades poéticas” para deixar o texto mais interessante – mas o resultado vale cada momento da leitura.
– Fotografia Básica de Langford e Fotografia Avançada de Langford, Michael Langford, Ed. Bookman – existem diversos livros que estampam o termo “tudo o que você precisa saber sobre…” mas, na prática, ficam devendo em alguns assuntos. Não é bem o caso destas duas publicações: Fotografia Básica e Fotografia Avançada vão fundo em aspectos técnicos realmente importantes, sem tornar o a leitura chata ou incompreensível.
Fonte: https://www.fotografia-dg.com/
Autor:Fernando Oliveira